quarta-feira, 29 de abril de 2015

Cidade tem déficit de policial por habitante

Folha de S. Paulo: Cidade tem déficit de policial por habitante PDF Imprimir E-mail
Folha de S. Paulo

O número ideal de policiais por habitantes recomendado pela ONU (Organização das Nações Unidas) é cinco vezes maior do que o existente em Cajueiro.

A ONU recomenda que haja 1 policial para cada 250 habitantes, segundo dados do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo. Em Cajueiro, há 1 policial para 1.360 habitantes.

Além do déficit de policiais, a delegacia de Cajueiro enfrenta o problema de falta de verbas e a dependência da prefeitura, o que não é raro no Brasil, segundo o delegado Paulo Siqueto, presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia Civil do Estado de São Paulo e membro da Confederação Nacional dos Delegados de Polícia.

"É uma prática comum no Brasil o fato de as prefeituras manterem as delegacias. Fornecem gasolina, pagam conserto de equipamentos e até compram sofás. A situação é mais drástica nos Estados do Nordeste, mas, em São Paulo, posso dizer que 70% das seccionais do interior sobrevivem graças ao apoio das prefeituras."

De acordo com o presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia Civil de Alagoas, delegado José de Oliveira Barbosa, "se as prefeituras não mantivessem as delegacias, elas já teriam fechado no interior de Alagoas".

"Estou na polícia desde 1964 e posso dizer que desde sempre as prefeituras fornecem desde combustível até a comida dos policiais", afirmou Barbosa.

Sem delegado

Em relação à falta de delegados de carreira em Alagoas, Barbosa conta que "quase a metade" das delegacias do interior do Estado funciona hoje apenas com um chefe operacional, e não um delegado de carreira.

O chefe operacional é, em geral, um agente de polícia que atua como delegado, mas não pode assinar os inquéritos, os quais acabam indo para os delegados regionais. Esses delegados acabam acumulando funções.

Para Nancy Cardia, pesquisadora e coordenadora do núcleo da USP, entre as consequências da falta de infra-estrutura e pessoal qualificado na polícia estão a "não-solução dos casos por falta de investigação adequada e o visível aumento da violência".

Roubos são mais comuns entre menores que estudaram menos; os mais escolarizados cometem agressões O tipo de infração cometida por adolescentes paulistanos varia de acordo com a escolaridade. As estatísticas mostram que os menores que estudaram menos concentram-se em crimes contra o patrimônio, enquanto os mais escolarizados envolvem-se em conflitos interpessoais.

Furto e roubo são os delitos mais comuns entre os que não concluíram o ensino fundamental. Já a lesão corporal (agressão) é a principal infração dos que chegaram ao ensino médio. Entre os universitários, o delito mais comum é dirigir sem habilitação.

Essa é uma das conclusões da pesquisa "O Adolescente na Criminalidade Urbana em São Paulo", desenvolvida pelo Núcleo de Estudos da Violência da USP a pedido do Ministério da Justiça.
A pesquisa examinou os processos de 3.893 adolescentes infratores entre 12 e 18 anos que passaram pelas quatro Varas da Infância e da Juventude da capital paulista entre 93 e 96.

Enquanto 66,7% dos adolescentes infratores que são analfabetos tentaram ou cometeram furto ou roubo, apenas 21% dos que estudaram até o ensino médio foram detidos por esses delitos.
Com as lesões, o quadro é outro: 20% dos menores infratores com 2º grau cometeram esse delito. O índice cai para 5,9% entre os analfabetos. E fica em 11,4% no grupo que tem só o ensino fundamental.

Como esse tipo de infração não mobiliza tanto a opinião pública quanto roubos e furtos, há uma percepção equivocada de que os adolescentes com menor escolaridade são os principais responsáveis pela delinquência juvenil.

"Há muito "chutômetro". Quando a população vê um adolescente pobre roubando na porta de um supermercado, faz inferências que nem sempre correspondem à realidade, como se ele fosse o responsável por todo tipo de delito cometido por menores", afirma o secretário nacional dos Direitos Humanos, José Gregori, que encomendou a pesquisa.

Escolaridade x Desemprego
Os 3.893 adolescentes que foram encaminhados às Varas da Infância e da Juventude entre 93 e 96 têm maior nível de escolaridade do que os que cometeram infrações de 88 a 91. Mas o número de empregados caiu no período.

O percentual de infratores que cursavam o ensino médio passou de 7,5% entre 88 e 91 para 11,3% entre 93 e 96. Já o percentual de adolescentes que afirmaram estar empregados no momento em que cometeram a infração caiu de 54,1% (88-91) para 36,7% (93-96).

Os autores da pesquisa afirmam que a mudança no perfil dos infratores é explicada, em parte, pelo fato de a escolaridade geral da população ter aumentado no período, enquanto o nível de emprego caiu.

Outra hipótese levantada pelo estudo é que setores da classe média urbana estão aumentando sua contribuição para os cenários de delinquência juvenil no Brasil.

Para Mário Volpi, oficial de projetos do Unicef, a mudança no perfil é uma combinação das duas hipóteses levantadas pela pesquisa do Núcleo de Estudos da Violência da USP.

"Quando há uma crise social grave, como a que passamos, há uma flexibilização dos padrões sociais. Isso faz com que o jovem termine confundindo os limites da informalidade e da ilegalidade, aumentando o número de delitos em todas as classe sociais", diz.

Gregori tem opinião semelhante. "Houve um aumento da escolaridade geral, mas também está havendo uma maior participação da classe média no contingente de infratores", afirma Gregori.

Adolescentes brancos, com maior grau de instrução ou que estejam empregados recebem medidas socioeducativas mais leves do que jovens negros, analfabetos ou desempregados que tenham cometido o mesmo tipo de infração. A diferença foi constatada pela pesquisa realizada pelo Núcleo de Estudos da Violência.

"Etnia, escolaridade e ocupação do adolescente exercem forte influência no desfecho processual. Adolescentes brancos, autores de infração, tendem a merecer medidas mais brandas do que adolescentes negros que cometem o mesmo tipo de delito", afirma a pesquisa coordenada pelo sociólogo Sérgio Adorno.

Por exemplo: 3,3% dos adolescentes sem o ensino fundamental completo que cometeram infrações violentas receberam medidas de internação ou semi-liberdade. Entretanto, somente 0,6% dos que cometeram infrações violentas e tinham o ensino médio foram punidos com medidas de restrição de liberdade. Entre os que chegaram à universidade, nenhum recebeu essa punição.

A aplicação de sanções também tende a ser mais complacente quando os adolescentes infratores declaram vínculos com o mercado de trabalho (veja quadro).

Embora não apontem as razões que fundamentem o comportamento dos juízes, os pesquisadores afirmam que "salta aos olhos a discriminação judicial que sugere, no limite, ausência de isonomia legal". Para o oficial de projetos do Unicef Mário Volpi, a conduta dos juízes é influenciada por preconceitos raciais e sociais.

"Os juízes não conseguem enxergar uma forma de inclusão social para o adolescente que não estuda, não tem emprego ou que não pertence a uma família estruturada. Há um preconceito da Justiça com as pessoas que não estão ajustadas a essa conduta, além do preconceito racial", diz Volpi.

Outra conclusão da pesquisa é que, de modo geral, há correspondência entre a gravidade das infrações e a severidade da medida aplicada. Ou seja: a maioria das infrações não violentas foi punida com medidas leves (advertência) ou médias: prestação de serviço à comunidade, reparação do dano, liberdade assistida, lar substituto.

A pesquisa "O Adolescente na Criminalidade Urbana em São Paulo", realizada pelo Núcleo de Estudos da Violência da USP, examinou os casos de todos os 3.893 adolescentes infratores entre 12 e 18 anos que tiveram passagem pelas quatro Varas da Infância e Juventude da cidade de São Paulo de 93 a 96.

Não há coincidência entre o número de ocorrências policiais (6.343) e o número de adolescentes infratores pesquisados porque cada garoto pode haver cometido mais de uma infração.

Os resultados foram comparados a um projeto anterior do núcleo em parceria com a Fundação Seade, entre 1988 e 1991. O primeiro projeto examinou 5.425 ocorrências.

O universo das duas pesquisas se limita à criminalidade oficialmente detectada. Ou seja, infratores que tenham sido surpreendidos pela polícia e processados.

 

Nenhum comentário: